Intitulatio [dar-se a si próprio um título].

terça-feira, 15 de dezembro de 2009

A grande solidão que de ti espero. / A voz com que te chamo é o desencanto /E o esperma que te dou, o desespero. (Ary dos Santos, 'Liturgia do Sangue'

Não é de todo parte de mim reconhecer-me em algum poema. As linhas da poesia, na minha crença, é como o fado, é preciso espírito para as apreender. Espírito é algo que me é estranho, algo do qual nasci desprovido. Acredito piamente nesta privação pois desde sempre ma apontaram. E a pior imbecilidade de sempre foi a de autorizar e admitir as opiniões dos outros. Eu sou como sou, fruto de quê neste momento não interessa, e, como tal, tenho (achava eu) direito à respiração.
Mais uma vez embusteado pela vida, pontapeado pelo próximo… A minha revolta, leia-se nestas linhas, não é com o próximo, é contra toda a fé que depositei neste. È, deste modo, contra mim, contra a minha permeabilidade ao que me rodeia.
Tenho 36 anos e, como tal, não deverá sequer me lembrar da permeabilidade humana. Já sou maturo para saber que, tal como Ary dos Santos, disse dos outros só se pode esperar a solidão e, de nós, apenas o desespero.
Embriagado pela morte tomei a ilusão como certa e, nas poucas fracções de lucidez, sinto a solidão. Embriagado creio que tenho uma família e amigos e sóbrio apenas o que resta de mim, o que ainda não conseguiram matar (ainda).
Desacompanhado nada vale a pena, inclusive respirar, comer e, principalmente, viver. Sóbrio é a pura realidade: mesmo que te rodeies com o mundo estás só e fodido.
Para quê a abstemia? Mais vale o engano. É mais fácil e apetecível.
Isto tudo porque, no dia de hoje, uma pretensa amiga, não de hoje mas de umas longínquas décadas, se lembrou de me classificar como “sempre inoportuno”. A minha embriaguez, já em processo de cura pela minha mulher, debilitada fortemente, desapareceu na totalidade. E o que surge quando a embriaguez se vai? A sobriedade…. Sóbrio estás só e fodido. E assim fodido fiquei. Uma pessoa (a suposta amiga) que sempre se questionou o porquê de eu ser tão critico e sempre a ter poupado. ..
Escrevo estas linhas para ficar, se dependesse de mim para a posteridade, para culpar a embriaguez… se não fosse a embriaguez já há muito que teria notado que, tal como os outros todos, amiga é que ela não é… e nunca a teria poupado.
Nesta conjuntura, estou disposto a tudo. A tudo menos à morte… E, se esta chegar, a única curiosidade que tenho é saber, para além de mim, quem mais a vai sentir. Será mais um pontapé? Acho que não, acho que nesta questão não sou parvo e que é a única certeza: Acho que nenhum dos vivos. Talvez o meu confessor, o meu “blog”…