Intitulatio [dar-se a si próprio um título].

sexta-feira, 22 de maio de 2009

mp4

Aprendi a inebriar-me com o MP4 de uma das minhas filhas. Eu, que considerava os fones apenas como o meio mais célere para alcançar a surdez, rendi-me ao feitiço de ter os ouvidos emudecidos. Silenciados com rádio ou com música. A surdez? Já não me preocupa… Similarmente, nos dias que se sucedem, só se escuta merda, nada de jeito. Já nada se descobre.
Um dos efeitos que mais me apraz, no dito mp4, é a alheamento ao que envolve fisicamente. Do estilo assistência que, apesar de estar colado ao ecrã, não faz parte dos que os seus sentidos, com a obvia exclusão da audição, pressagiam.
É um sentimento, tal como o que os vidros de um carro oferecem aos seus ocupantes, de falsa segurança. Há o mundo “dentro” e o mundo “fora” do carro. O vidro é uma barreira inexcedível e, subsequentemente, não se tocam os dois mundos. Não há riscos. Está-se estável dentro de um carro. Seguro.
É um falso sentimento, evidentemente, pois estes vidros, na generalidade, podem ser partidos ou abertos. E, claro está, não é o louvado mp4, ao distrair os ouvidos que impede esse corpo de sentir, por exemplo, os dissabores de uma bala.
Mas bendito seja o encantamento, por inibição de um dos sentidos, que apesar da falsa fiança, nos ajuda e muito, abstrair da desengraçada humanidade que nos abarca. Abstraídos desta conseguimos, desacompanhados, ser bem-aventurados.
MERQUEM fones! É preferível a se devotarem aos psicotrópicos.